DENÚNCIA. PREGÃO PRESENCIAL. PREFEITURA MUNICIPAL. REGISTRO DE PREÇOS. AQUISIÇÃO PARCELADA DE PNEUS NOVOS, NÃO REMOLDADOS OU REFORMADOS. LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA. EXCLUSIVIDADE PARA MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE SEDIADAS NO LOCAL OU REGIONALMENTE. INDEVIDA RESTRIÇÃO À PARTICIPAÇÃO DE LICITANTES. DENÚNCIA PROCEDENTE. RECOMENDAÇÃO.
1. Os objetivos anunciados no art. 47 e a prerrogativa estabelecida no art. 48, §3º, da Lei Complementar nº 123/06 não garantem à Administração a possibilidade de limitar geograficamente o espectro de licitantes aptos a participar do certame. Na verdade, os referidos dispositivos fixam apenas, respectivamente, comando geral de tratamento diferenciado e critério de diferenciação das propostas entre licitantes.
2. O art. 47 impõe a necessidade de se conceder tratamento diferenciado e simplificado às MEs e EPPs e o art. 48, §3º, da Lei Complementar nº 123/06 ao optar pela terminologia ¿prioridade¿ em detrimento de ¿exclusividade¿ ¿ registra-se, empregado no mesmo art. 48, em seu inciso I ¿, estabelece tratamento mais favorável às MEs e EPPs sediadas local ou regionalmente, mas sem garantir à Administração a discricionariedade de restringir com base em critérios geográficos a participação de potenciais licitantes.
3. A Lei nº 8.666/93 veda ao administrador o estabelecimento de preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, sob pena de restrição ao caráter competitivo da licitação.
4. A imposição de excepcional restrição à participação de interessados em procedimentos licitatórios com base em critérios geográficos depende da demonstração concomitante da existência dos seguintes requisitos, em consonância com os ditames da Lei nº 8.666/93 e nos termos já decididos por este Tribunal nos autos da Consulta nº 887.734: as especificidades do objeto licitado, a pertinência técnica para o específico objeto licitado, o princípio da razoabilidade e a vantajosidade para a Administração, com fulcro no art. 3º, caput, e §1º, I, c/c art. 6º, IX, todos da Lei nº 8.666/93.
5. A Administração tem a prerrogativa de deflagrar procedimento licitatório que preveja cláusula de tratamento diferenciado de propostas para as MEs e EPPs, nos termos do art. 47 c/c art. 48, §3º, da Lei Complementar nº 123/06, em que caberá também a demonstração dos ônus específicos deste compêndio legal, seja com a demonstração dos objetivos do tratamento diferenciado ¿ quais sejam: a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica ¿, seja com a demonstração da existência de um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório (art. 49, II, da Lei Complementar nº 123/06).
6. A restrição geográfica é cláusula excepcional a ser empregada nos certames, essa opção deve vir devidamente justificada na fase interna do procedimento, a fim de que se demonstre que as características específicas daquele objeto fundamentam esse tratamento especial, sem impactar significativamente a competitividade da licitação, em conformidade com as vedações previstas no art. 3º, §1º, I, da Lei nº 8.666/93. Noutro falar, deve restar comprovado que a restrição estabelecida no instrumento convocatório não é impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, mas uma condição para sua adequada obtenção pela Administração.
7. A Lei Complementar nº 123/06 somente impõe aos licitantes, caso adimplidos os requisitos previstos em seu art. 49, a realização de licitações com lotes exclusivos às MEs e EPPs quando o valor destes for inferior a R$80.000,00 (oitenta mil reais). Desse modo, reitere-se, não há previsão naquela norma de regra que garanta à Administração, seja por discricionariedade, seja por estrito cumprimento de lei, a prerrogativa de limitar geograficamente a participação de interessados no certame, com base simplesmente no fato de as empresas licitantes serem MEs ou EPPs.
8. Ainda que a busca por fomentar a economia regional seja princípio a ser respeitado e promovido, este por si só não pode justificar o estabelecimento de cláusula de restrição geográfica.
9. Registre-se que, mesmo em cenários em que seja verossímil a necessidade de limitação de distâncias entre contratante e contratado em função do objeto a ser contratado, ainda existe o ônus para a Administração de motivar em seus instrumentos convocatórios sua decisão administrativa.
10. O disposto nos arts. 47 e 48 da Lei Complementar nº 123/06 não legitima que a Administração, por discricionariedade administrativa, estipule restrição à participação de potenciais licitantes em razão da distância de localização de sua sede.
11. O art. 48, §3º, da Lei Complementar nº 123/06 estabelece tão somente critério objetivo de prioridade para as MEs e EPPs sediadas local ou regionalmente, e não cláusula de exclusividade para essas empresas em certames licitatórios.
12. Recomenda-se que a Administração, em futuros certames, ao prever cláusula excepcional de restrição geográfica apresente justificativa que contemple as especificidades do objeto licitado, a pertinência técnica para o específico objeto licitado, o princípio da razoabilidade e a vantajosidade para a Administração, em consonância ao art. 3º, caput, e §1º, I, c/c art. 6º, IX, todos da Lei nº 8.666/93.